segunda-feira, agosto 01, 2005

o eterno retorno (eu sou aquele que grita pelo passado, eu sou aquele que olha pro futuro)

Quando vi meus pés levemente empoeirados e o frio a me abraçar percebi que a companhia de tudo o que se foi às vezes me era preciosa. A represa e o barulho de litros d'agua atravessando a ponte que liga o trecho mais dificil de dois mundos prestes a se partir. Andei para um lado, ensaiei uma volta ao carro e nao consegui com a facilidade esperada. Querendo mesmo ficar era o meu coração, um querer de que trechos de hora fossem um vinyl sem arranhões, a melhor parte executada proxima do ouvido sob juramento de nunca enjoar. Porque mesmo apos tantos enjoos, certos espaços de tempo que eu alimento dentro de mim procuram referencias para se repetirem em unissono, é o encontro do meu céu com a terra que devo pisar.

A volta pela cidade que deixei há anos não pára, volta essa que me consome e me reanima seja em cada curva ou nos incontaveis passos dados fora do carro. Os farois iluminam em parte buracos na velha estrada, esses nem sempre são maiores dos que levo na minh'alma. Os postes apagados me trazem à tona quando a luz vinha de dentro de nós e era intermitente. Amostras de saudade em semitons, doces reminiscencias que discretos outdoors com velhas propagandas mostram um progresso distante do meu passado.

Ao topo da cidade que me perdeu, pequenas casas nunca sairam do lugar, os velhos guardas passam apitando um som inaudivel e descobrem a solidão em cada esquina, moleques fogem de puxões de orelha e passam rente aos meus pés aos berros, é a felicidade crua em disparada. Às dez da noite tudo já é tarde e quieto. A escuridão por lá é a hora de guardar pequenas doses de segredo dentro de cada um. Por onde vivo, a noite perde-se e me acha nos neons da cidade, nos semaforos que tenho medo, em felicidades embaladas por músicas que nao entendo, por prazeres contidos em copos de vidro.

Piso em falso e dói, sei mesmo assim que não é hora pra lagrimas, nem de adeus. Tudo parece ser tão perto quando a distancia nao é o medo de estar longe, é o medo das coisas que mudam fora do alcance dos olhos, é o susto das minhas mudanças frente a tudo o que se parece ser tão igual. É ver pequenas pedras presas ao chão ficarem no mesmo lugar, enquanto dentro da pequena cidade que dorme, busco sobras de alguem perdido nos contornos de ruas, em passeios com pequenas arvores a crescer, elementos de uma jornada que só eu posso construir. Sorrio porque muitos como eu destroem e constroem a cada dia casas invisiveis, dias surreais.

Na rua das casas abraçadas a conversa na janela prossegue, a fogueria crepita na porta da casa e o sereno molhando carrinhos de mão. Pequenos motivos que despertam a vontade de deitar no colo de alguem ou passear descalço, de não ligar pra hora enquanto telefones, computadores e tristezas voltam a pertencer a um mundo eu só vejo passar na velha tv da vizinha. Sem trocadilhos em outro idioma, sem falar de livros que mudaram nossas vidas, sem mensagens vazias no visor do celular num segundo que seja. Quero falar sobre onde esse trem barulhento vai parar na alta noite. Falar do futuro como algo distante como a serra verde que à noite esconde bichos bonitos, falar do passado às alturas, falar dos outros como se soubessemos o proximo passo de cada estranho a enfrentar o escuro.

A noite nunca morre assim, mesmo que o amanha seja o mais bonito desde a epoca dos nossos pais. Noite essa que embala o membro mais novo da minha familia, que aos quatro anos corre como um louco e fala todas as verdades que me faz rir. Se ele soubesse que tudo o que me é mais raro algum dia seriaa leiloado em nome de uma segunda infancia, que as suas pequenas sandalias ao caber no meu bolso trazem a sensação de uma primeira velhice e o gosto agridoce da responsabilidade. Nos seus olhos pequenos tudo se parece grande demais, pois entao como a gente chegou tão alto se a pequenez é andar na trilha de soluções coloridas?

Deixo tudo como esta, na estante mental tudo assim fica incolume até segunda ordem. Como se fosse o primeiro dia de um agosto qualquer e nossos segredos de doze anos atras virassem alimento pra risadas interminaveis, como se o mundo que pensavamos ser nosso nunca pudesse envelhecer naquela foto do mural.

- Quando vamos fingir que o mundo é nosso de novo? Pra começar eu nao finjo o que nao sou, nunca. Pra terminar, nossas lembranças serão nosso trato rumo a eternidade...